É a primeira deserção em razão de ameaças do governo de Cuba para que parentes voltem à ilha. Ela viajou com filho e marido; ministério diz não poder interferir em relação entre profissionais e Cuba
Pressionada pelo governo de Cuba para que seu marido e seu filho de cinco anos voltassem à ilha, a médica Dianelys San Roman Parrado fugiu para Miami (EUA) no último sábado (28).
Ela havia ingressado em dezembro de 2013 no Mais Médicos, bandeira da presidente Dilma Rousseff (PT) para levar profissionais ao interior do país e à periferia de grandes cidades. Trabalhava em Jandira, na Grande SP.
É a primeira deserção em razão de pressões para que parentes voltem à ilha.
Conforme revelou a Folha, Cuba tem ameaçado substituí-los ou cassar seus diplomas caso os familiares permaneçam no Brasil. Também está retendo na ilha os médicos que saem de férias –eles precisam, necessariamente, gozá-las em Cuba.
A medida seria para prevenir eventuais deserções.
Dianelys confirmou a fuga neste domingo (29) em mensagem enviada a seu supervisor, o médico Gustavo Gusso, professor da USP. Disse não ter aguentado a pressão para o regresso do marido e do filho. Contou que havia chegado a Miami em segurança e que estava com amigos.
Em conversa com a Folha em 12 de março, Dianelys disse que o filho estava estudando em uma escola bilíngue e o marido vinha trabalhando em uma fábrica de parafusos. “Gosto do meu trabalho, mas não quero me separar deles por nada”, disse, na ocasião.
Marido e filho haviam chegado ao Brasil em novembro.
Segundo Gusso, Dianelys não deu sinais de que pretendia desertar. “Ela fazia um ótimo trabalho. Ficou felicíssima quando o marido e o filho vieram. Ultimamente, estava muito nervosa com a pressão [do governo cubano]. Tinha medo, chorava”, diz.
A Secretaria da Saúde de Jandira informou que a médica não foi trabalhar na última semana e não fez nenhum contato. O prazo legal para que ela justificasse as faltas terminou na sexta (27).
Em nota, o Ministério da Saúde informou que aguarda comunicado oficial da ausência. A médica será notificada e terá prazo de 48 horas para se justificar. Caso isso não ocorra, haverá processo para desligá-la do programa.
Até dezembro, dos 14.462 profissionais trabalhando no Mais Médicos, 11.429 (79%) eram cubanos. Desde o início, ao menos 40 desertaram.
Os médicos dizem que, ao serem contratados, foram informados que poderiam viver com as famílias. O Brasil concede aos parentes visto de permanência de 36 meses –mesmo tempo dado a eles.
Emissários de Cuba têm dito aos médicos que o contrato prevê visitas, não moradia. O documento, porém, não estipula prazo para as visitas.
A Folha tenta há três semanas falar com o governo cubano. Não houve retorno de e-mails e ligações.
O Ministério da Saúde alega não poder interferir nas relações trabalhistas entre os profissionais e Cuba.